Deus Se oculta aos olhos de quem O ama? (cont)
Bruna Corrêa Salgado
Esta noite escura é um influxo de Deus na alma, que a purifica de suas ignorâncias e imperfeições habituais, tanto naturais como espirituais. […] Nela vai Deus em segredo ensinando a alma e instruindo-a na perfeição do amor, sem que a mesma alma nada faça, nem entenda como é esta contemplação infusa.2
É neste período que “mais facilmente nos purificamos das desordens de nossos afetos”3.
Podemos encontrar quatro razões pelas quais Deus prova a alma através das securas e aridezes: a primeira delas é para “nos desprender de tudo quanto é criado, até mesmo da doçura que se encontra na piedade, para aprendermos a amar a Deus só, e por Si mesmo”4. A segunda, para nos humilhar, mostrando-nos que não merecemos as consolações, que “são favores essencialmente gratuitos”.5 Outra razão é que com elas nos purificamos mais, “tanto das faltas passadas como das afeições presentes e de qualquer inclinação egoísta”.6 Por último, elas nos robustecem a virtude.7
Sendo assim, devemos confiar que “se Deus manda as provações, é com um fim determinado. Desde que o fim seja atingido, a provação perde a sua razão de ser”.8
Entretanto, essas são as horas em que Nosso Senhor está mais perto de nós, e com sua infinita bondade de Pai, nos diz:
Meu filho, chegou o momento da aridez e da dor, para provar se é capaz de ser fiel agora como o foi na alegria. Tudo lhe parece enfadonho, você tem a tentação de pensar continuamente noutra coisa, está fascinado por algo que não presta, e não lhe sai da cabeça. Estou lhe deixando longe do prazer que teve, porque desejo que você se dê inteiro. […] Mas tenha a convicção de que, depois da hora mais negra, semelhante à de uma morte, virá a ressurreição das alegrias de outrora, mais esplêndidas e maiores do que antes.9
Cornélio a Lápide, recordando um pensamento de São João Crisóstomo, afirma que “Deus costuma permitir que santos autores de grandes gestos heroicos sejam sujeitos a temores e tentações a fim de conservá-los na humildade e os obrigar a recorrer ao seu auxílio”.10 Esses períodos de provação fazem com que o homem se desapegue do que não é Deus, purificam a alma pelo sofrimento, movem-no a desejar o Céu e a perfeição que é o caminho para lá, contanto que ele tire proveito dessas provas para se voltar para Deus.11
Encontramos nas Sagradas Escrituras várias passagens nas quais Deus manda as provações a fim de nos emendarmos, pois Ele “jamais quer a morte do pecador, mas sim que se converta e viva” (Ez 33, 11). Assim, lemos no livro dos Provérbios: “Não desprezes, meu filho, as lições de teu Deus; nem te irrites quando Ele te repreender, pois o Senhor castiga aquele a quem ama, como a um filho querido” (Pr 3, 11-12). E São Paulo diz: “É para vossa emenda que sofreis a provação” (Hb 12, 7-10).
Quando o Menino Jesus desapareceu, Nossa Senhora e São José começaram logo a procurá-Lo e O encontraram-No templo. E nós, o que devemos fazer quando “percebemos que estamos sem graças sensíveis, sem aquilo que nos dava ânimo e sustentação para praticar a virtude?” Devemos “ir atrás do Menino Jesus, isto é, pôr-se à procura da graça sensível, quando ela se retirar […] [e] procurar Jesus no Santíssimo Sacramento”.12 Com efeito, “é nesses momentos preciosos que o Pai nos fala e nos ensina a ir ao encontro de seu Filho”.13
“Onde houver um tabernáculo, ali estará a origem de toda alegria, a solução de todos os males, a luz para qualquer caminho obscuro. Quem se aproxima do Santíssimo Sacramento e, mais ainda, quem comunga, recebe uma força espiritual superior às energias humanas”. 14
Quanto tempo passa Nosso Senhor sozinho no tabernáculo, à espera de alguém que se aproxime para rezar? Quantas vezes Ele não teria uma palavra a me dizer pelo simples fato de eu procurá-Lo nas horas das maiores angústias? E eu, entretanto, nem sequer pensei em buscá-Lo. Não fazemos ideia de que “ao receber nossa visita, Jesus estremece de alegria no Santíssimo Sacramento, ainda mesmo quando o seu visitante é um pecador, que Ele procura atrair a Si”. 15 Quando passamos diante do Santíssimo Sacramento, devemos pensar: “Lá está Ele preso. Ele sujeitou-Se a esta prisão porque quis, para ter a delícia de que eu fizesse diante d’Ele uma genuflexão dizendo, por exemplo, ‘Coração Eucarístico de Jesus, tende piedade de nós’”. 16
Que consolação [para] nós, com efeito, pensar que [Maria e José] compreendem experimentalmente os nossos sofrimentos e que cordialmente deles comparticipam! Que incentivo, sabermos que Deus não poupa os que mais ama e que muitas vezes a prova está longe de ser uma punição! 17
Em uma revelação à Santa Margarida Maria, Nosso Senhor, mostrando-lhe seu Coração ferido, disse-lhe: “Tenho uma sede ardente de ser amado pelos homens no Santíssimo Sacramento, e não encontro quase ninguém que se esforce, segundo o meu desejo, para Me desalterar, usando para comigo de alguma paga!”.18 O Divino Redentor, do fundo do tabernáculo, “clama a todos aqueles que sofrem, que estão necessitados, desgraçados: ‘Vinde a mim e Eu vos aliviarei’. […] É sempre o bom Pastor a amar suas ovelhas, a nutri-las com sua Carne e com seu Sangue”. 19
Como Bom Mestre, Ele aponta o caminho do Céu, sendo “sempre o Salvador em estado de imolação, oferecendo-Se sem cessar ao Pai, como o fez na Cruz, pela salvação dos homens”.20
E o que acontece ao término da prova?
Quando uma alma piedosa sai, por fim, duma rude provação e encontra diante dela […] Aquele a quem chorou como perdido, a sua surpresa manifesta-se por estas mesmas exclamações: Por que me tínheis Vós abandonado? Por que me deixastes na angústia de tantos receios, no horror de tentações aviltantes? Onde estáveis então? […]: “Estava no meio do teu coração”.21
Ou seja, lá estava Nosso Senhor, escondido em nosso interior, sustentando-nos durante a provação.
Concluímos com um comentário do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira a respeito da aridez:
[Nossa Senhora] nos promete tanta coisa! Ela não está no direito de pôr nossa alma a uma prova? Tem sentido que Ela não exponha nossa alma a uma prova? Essa prova tem que vir, e nós devemos desejá-la. Ela é dura, mas nós queremos mostrar a nossa gratidão. E não é só questão de mostrar, é exercitar, praticar. Nós queremos ser gratos […]. Então, às vezes […] as delícias se apagam. Por detrás das nuvens Nossa Senhora acompanha nossa alma. Ela está dentro de nós pela sua ação e pela sua graça; Ela está dentro de nós e nos ajuda. Nós também não percebemos. E nós pensamos que estamos andando sozinhos, que estamos abandonados. Perguntamos: haverá, neste abandono em que estou e que eu não sinto mais o paraíso de outrora, haverá para isso alguma culpa de minha parte? Oh Deus, se há, Deus foi tão bom para comigo que assim mesmo eu confiarei n’Ele! Há uma frase da Escritura que me agrada enormemente: Etiam si ambulavero in umbra mortis, non timebo mala (Sl 23, 4). Ainda que eu caminhe nas vias sombrias da morte, eu não temerei os males porque Deus é meu Pai e Ele me perdoará porque Nossa Senhora é minha Mãe e rezará por mim! É justo que Ele me prove. Quem sabe se é uma prova! E quem sabe se eu sendo fiel agora, eu faço com que os Anjos cantem no Céu! Eu me sinto só, abandonado, mas os Anjos cantam no Céu! Há coisas assim na nossa vida espiritual: nós vamos para frente, etc., e começa o demônio a tentar, começa a se empalidecer o horizonte de delícias no qual nós caminhávamos […] É o Pai […] que encheu de bens, mas agora quer uma prova de gratidão. E no caso concreto quer que o filho diga: “Não; o que vale não é o que eu, miserável, estou vendo nesse momento de provação. O que é verdade não é o que aparece nos meus olhos turbados por uma prova interior muito grande. É verdade o que ensina a Santa Igreja Católica Apostólica Romana, à qual eu quero ser fiel nas mais terríveis aridezes, à qual eu quero ser fiel nas mais terríveis provações. […] Seja como for, caminharei no escuro e nas trevas, poderei sentir-me abandonado por todos e até por Deus, mas Deus não me abandonará e não morrerá em minha alma a convicção de que a Mãe d’Ele reza por mim no Céu, que Ela pode tudo e que Ela consegue todos os perdões!22
1 GONZÁLEZ Y GONZÁLEZ. Op. cit. p. 216.
2 SÃO JOÃO DA CRUZ. Noite escura. L. II, c. 5, n. 1. In: Obras Completas. 7. ed. Petrópolis: Vozes, 2002, p. 693-694.
3 CLÁ DIAS, João Scognamiglio. A borrasca: um castigo ou uma graça? In: O inédito sobre os Evangelhos. Comentários aos Evangelhos dominicais do Tempo Comum. Ano B. Città del Vaticano – São Paulo: LEV, Lumen Sapientiae, 2014, v. IV, p. 186.
4 TANQUEREY. Op. cit. § 926, p. 441.
5 Loc. cit.
6 Loc. cit.
7 Cf. Ibid. p. 442.
8 BEAUDENOM. Op. cit. p. 388.
9 CORRÊA DE OLIVEIRA. O Sibarita, o herói e o Mártir do Gólgota. Op. cit. p. 17.
10 CORNÉLIO A LÁPIDE, apud CLÁ DIAS, João Scognamiglio. Comentário à Liturgia do XIX Domingo do Tempo Comum. São Paulo, 10 ago. 2003. (Arquivo IFTE).
As matérias extraídas de exposições verbais – designadas neste trabalho, segundo sua índole, como conferências, palestras, conversas, homilias ou comentário à Liturgia – foram adaptadas para a linguagem escrita.
11 Cf. TANQUEREY. Op. cit. § 428, p. 210.
12 CLÁ DIAS. Como encontrar Jesus na aridez? Op. cit. p. 141.
13 Id. Eu sou o Pão vivo descido do Céu. In: O inédito sobre os Evangelhos. Op. cit. v. IV, p. 290.
14 WERNER, Carmela. Confiança, a regra de ouro. In: Arautos do Evangelho. São Paulo: Ano IX, n. 99, mar. 2010, p. 33.
15 CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. Intimidade com Jesus na Eucaristia. In: Dr. Plinio. São Paulo: Ano VI, n. 62, maio 2003, p. 25.
16 Loc. cit.
17 BEAUDENOM. Op. cit. p. 389.
18 SÃO PEDRO JULIÃO EYMARD. A Divina Eucaristia: Escritos e sermões. São Paulo: Loyola, 2002, v. V, p. 119.
19 Ibid. p. 120-121.
20 Ibid. p. 121.
21 BEAUDENOM. Meditação LXXVII. Jesus perdido e achado. In: Meditações afectivas e práticas sobre o Evangelho. Op. cit. p. 394.
22 CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. Conferência. São Paulo, 17 ago. 1985. (Arquivo IFTE).
Salve Maria,Queridas Irmãs do Arautos do Evangelho,EP
Em atenção especial aqui à Sra. Bruna Corrêa Salgado,
Muito obrigada por tão lindos textos.
É bem verdade que os tempos sombrios,de aridez,as notes escuras,como dizia São João da Cruz,são momentos de provações e momentos esses que nos fazem sofrer muto,muto mesmo….mas quando percebemos o valor desse momento ,sentimo-nos felizes,Alegres ….porque é nesse momento crucial que vemos e sentimos melhor a Deus!!!Nesse momento de aridez,que “pensamos”estar abandonados….não estamos!!!pelo contrário!!!Deus está ali conosco,Nossa Senhora está ali pertinho de nós….mas estamos tão “cegos”em nossas dores,em nossas misérias….que nem percebemos e daí a importância de rezar insistentemente o terço,o ROSÁRIO!!!porque só quem reza,se salva!!!Não adianta pedir orações aos outros,temos que fazer a nossa parte,colocarmo-nos mesmo de joelhos,entregarmo-nos por completo,desnudarmo-nos por inteiro na frente de Deus e Nossa Senhora para que então,possamos ver a Claridade e sairmos dessa tenebrosa note escura revestidas da Glória de Nossa Senhora e dizermos:Venci mais um dia de trevas,mas um dia de provação!Podemos cair,errar mil vezes!!!mas mil e uma vezes levantaremos,se assim o desejarmos!Se assim pedirmos à intercessão de Nossa Senhora ao seu Amado Filho,Nosso Senhor Jesus Cristo,Deus Filho,pos ELA nunca abandonou e nem abandonará nenhum de seus filho(a)s,por mais miserável que ele(a) seja.
Sta.Teresinha do Menino Jesus,rogai por nós!
São João da Cruz,rogai por nós!
Se há trevas….é porque também há….Luz!!!
Beijos para todo(a)s!
Ceres Paes.
O comentário do Prof. Plínio C. de Oliveira, é um incentivo para termos mais fé.e animo.
Um filho cumulado de bens, graças e bênçãos paga o que recebeu e pagando o que recebeu fica pronto para que Deus lhe peça novas provações e de novas manifestações de heroísmo e na hora da morte Deus introduza no Céu dizendo esse é um herói a mais, um universo de heróis que é o reino dos Céus.
Confiança confiança confiança.
UDS SON LA ESPERANZA ESCRITA POR EL PROFETA SAN LUIS MARIA DE MONFORT AL LEER ESTOS ESCRITOS TAN PROFUNDOS ES QUE LLEVAN UNA VIDA DE SANTIDAD SIGAN ADELANTE NO MIREN PARA ATRAS NUNCA LA LUZ UDS YA SABEN VIENE DESDE EL CIELO DE LOS SANTOS PATRONES. NUESTROS SANTOS FUNDADORES