Pináculo de pedra, auge de amor
Fahima Spielmann
— O martelo! — pede alguém.
— Cuidado com as pedras! — avisa outro.
— O que fazes?
— Como vês, estou quebrando pedras — responde o primeiro.
A mesma pergunta é feita a outro, que diz:
— Trabalho arduamente, levantando estas sólidas paredes de pedra, para ganhar o sustento de minha família.
Por fim, a indagação é dirigida a um terceiro trabalhador:
— E tu, o que fazes?
— Para glória do bom Deus e salvação das almas, estou construindo uma catedral!
Aos olhos dos homens esses três operários realizavam o mesmo trabalho, mas os dois primeiros tinham os olhos da alma voltados para o chão, enquanto o espírito do terceiro apontava para o Céu, como o fariam em breve as pedras que lavrava com esmero para finalizar os pontos mais altos da catedral.
Com efeito, parecendo desafiar a lei da gravidade, os tão característicos pináculos da arquitetura gótica dão-nos a impressão de querer perfurar o firmamento, assemelhando-se à alma que, estando ainda na Terra, vive nas cogitações do Céu. Simbolizam essas agulhas de pedra a oração da Igreja ao Espírito Santo: “Ut mentes nostras ad cælestia desideria erigas! — Dai às nossas mentes o desejo das coisas do alto!”.
Ora, almas há que procuram viver o tempo todo buscando auges, como que “na ponta dos pés”, propondo-se metas ousadas para as quais apenas o Céu é o limite.
Um exemplo dessas almas pinaculares foi Santa Teresinha do Menino Jesus. Tendo ela abandonado tudo para encerrar-se na clausura do Carmelo, sentia-se ainda insatisfeita. “Sinto em mim a vocação de guerreiro, de sacerdote, de Apóstolo, de doutor, e de mártir” — clamava essa alma inocente. “Sinto a necessidade, o desejo de realizar por Ti, Jesus, todas as obras, as mais heroicas… […] Ó Jesus! Meu amor, minha vida!… Como conciliar estes contrastes? Como realizar os desejos de minha pobre alminha?…”. 1
A Doutora da Pequena Via compreendeu que não era impossível alcançar este auge. Bastava um elemento: o amor. Sua vida, que nas exterioridades nada parecia ter de extraordinário, transformou-se em modelo para o mundo. Soube ela colocar nos mínimos atos de sua existência o impulso que inspirava o nosso terceiro trabalhador, o qual sabia que cada martelada, cada parede levantada era, na verdade, um ato de amor a Deus. E se aquele bom homem colaborou para construir uma catedral, Santa Teresinha levou a cabo uma obra incomparavelmente mais grandiosa, a qual ultrapassou a elevação das agulhas de todas as catedrais da Terra.
1SANTA TERESA DE LISIEUX. Manuscrito B. Todas as obras, as mais heroicas. In: Obras Completas. São Paulo: Paulus, 2002, p.171.