A CONFIANÇA NA MATERNALIDADE DE MARIA
Raphaela Nogueira Thomaz
Com o cunho de seu gênio e hábil maestria em temas marianos, assim ensina São Luís Maria Grignion de Montfort: “A Santíssima Virgem, sendo necessária a Deus, duma necessidade chamada hipotética, devido à sua vontade é muito mais necessária aos homens para chegarem a seu último fim”. 1
De fato, logo no início do cristianismo, os primeiros cristãos aliaram, ao título de Mãe de Deus, invocar Maria enquanto Mãe dos homens.
De modo algum sairá confundido quem a Ela recorre e busca seus ensinamentos maternais. Nos escritos de Veremundo Toth em louvor a Maria, encontramos: “Com sua bondade, Maria cativa, até hoje, inúmeros homens que têm a certeza de que alguém que recorreu à proteção de Maria e implorou sua assistência nunca foi por Ela desamparado. E por que essa confiança ilimitada na Virgem Maria? Porque Ela nos ama, sendo nossa Mãe”. 2
A esse respeito, recordemo-nos das palavras do Divino Mestre:
E qual de vós porventura é o homem que, se seu filho lhe pedir pão lhe dará uma pedra? E, se lhe pedir um peixe, dar-lhe-á uma serpente? Se vós, pois, sendo maus, sabeis dar boas dádivas a vossos filhos, quanto mais vosso Pai, que está nos céus, dará bens aos que Lho pedirem. (Mt 7, 9-11).
Como age o Pai em relação aos que a Ele Se voltam, de igual modo, guardadas as devidas proporções, o faz a Rainha dos Céus. Foi justamente para demonstrar o amor que o Padre Eterno nos tem, que Ele quis dar-nos Maria como Mãe. Segundo as palavras de São João Paulo II em sua Encíclica Redemptor Hominis: “ […]esse amor aproxima-se de cada um de nós por meio desta Mãe e, de tal modo, adquire sinais compreensíveis e acessíveis para cada homem”. 3
A necessidade dos filhos e o socorro da Mãe Celeste
Declinaremos a seguir um fato narrado pelo doutor e moralista da Igreja, Santo Afonso Maria de Ligório, 4 em que vemos ilustrada a proteção maternal de Maria aos que A invocam, mesmo quando os réus se encontram em extremos de crimes e devassidão.
Conta-nos ele que, por volta do ano de 1604, em Flandres, dois jovens, descuidando-se dos estudos, começaram a levar uma vida desenfreada, entregando-se a toda espécie de libertinagem. Aconteceu que, certo dia, estando eles numa casa de perdição, ocorreu a um deles, chamado Ricardo retirar-se dali, enquanto o companheiro lá permanecia.
Ao chegar a casa e se aprontar para dormir, Ricardo lembrou-se de não ter ainda recitado umas Ave-Marias, como era seu costume, em honra da Virgem Maria. O sono o impedia a isso e pouco desejo tinha ele de o fazer, mas por fim, acabou concluindo essas orações e adormeceu. De repente, ouviu alguém bater fortemente à porta. Sem que tivesse tempo de se levantar, vê diante de si o companheiro, com a fisionomia horrivelmente desfigurada.
— Ai, pobre de mim! — exclamou aquele infeliz — ao sair daquela casa infame, veio um demônio e me sufocou. O meu corpo ficou no meio da rua, a minha alma está no inferno. Sabes, pois — acrescentou —, que o mesmo castigo te tocava a ti. Mas a bem-aventurada Virgem, pelo teu pequeno obséquio das Ave-Marias te livrou dele. Ditoso de ti, se tu souberes aproveitar deste aviso que a Mãe de Deus te manda por mim. 5
Dito isso, mostrou o condenado as serpentes que o mordiam, escondidas sob a capa, e a visão se desfez. Ricardo caiu em si, tocado pela graça, e enquanto dava glórias à Santíssima Virgem pela misericordiosa intercessão, procurava um meio de mudar de situação e expiar seus graves pecados. Neste momento, soaram os sinos de um mosteiro próximo, chamando os frades ao cântico de matinas, e Roberto entendeu ser aquele o local designado por Deus para sua vida penitente. Dirigiu-se ao superior do convento e após o relato da terrível visão, pediu-lhe acolhida. Para comprovar o fato, dois religiosos foram ao local por ele indicado e encontraram o corpo do infeliz, já escurecido pelo sufocamento.
Santo Afonso conclui o relato dizendo que após terem os franciscanos admitido em sua Ordem o jovem Ricardo, este levou uma vida exemplar entre os monges. Por fim, depois de intensos labores apostólicos nas Índias, foi conduzido em missão ao Japão, onde morreu mártir, por amor a Jesus Cristo.
É este episódio apenas um entre inúmeros, nos quais sempre se verificou o socorro de Nossa Senhora, corroborando nos fiéis uma grande confiança em sua Mãe e Rainha.
Este amparo maternal de Nossa Senhora a cada filho seu se manifesta com um matiz diferente, mas sempre sublime. Nesse sentido, a história de cada homem, quando dócil aos chamamentos da Mãe Celeste, pode ser resumida numa escalada de sublimes comunicações entre Mãe e filho: Maria e cada homem em particular. E quanto mais esta relação se torna íntima e intensa, tanto mais a vida adquire brilho. O ânimo da vida vem quando se toma contato com a maternalidade de Maria e se experimenta suas carícias, porque então as asas para o voo a Deus começam a nascer.
1SÃO LUÍS MARIA GRIGNION DE MONTFORT. Tratado da verdadeira devoção à Santíssima Virgem. 34.ed. Petrópolis: Vozes, 2005, p. 42-43.
2 TOTH, Veremundo. Louvores à Virgem Maria: Reflexões sobre a Ladainha de Nossa Senhora. 3.ed. São Paulo: Vozes, 1998, p. 34.
3 JOÃO PAULO II. Carta Encíclica Redemptor Hominis, n. 22.
4 SANTO AFONSO DE LIGÓRIO. Glórias de Maria. 2.ed. Aparecida: Editora Santuário, 1987, p. 189.
5 Ibid.