“SOU CRISTÃO”

martirJuliana Montanari

Fazer tal afirmação, nos dias atuais, não causa tantas contrariedades como nos antigos tempos, em que incontáveis mártires deram suas vidas com derramamento de sangue, e regaram o solo para que esta afirmação pudesse perdurar pelos séculos futuros. De fato, ao olharmos para o passado, quanto sangue, suor e lágrimas foram necessários para que hoje se pudesse dizer com toda propriedade e ufania que somos filhos de Nosso Senhor Jesus Cristo e da Santa Igreja.

Nos primeiros séculos, os imperadores romanos infligiam aos cristãos torturas as mais cruéis possíveis, pensando assim que acabariam com a verdadeira religião. No entanto, quanto mais os justos vertiam sangue, mais faziam a Igreja florescer, pois, vendo a coragem com que os mártires entregavam-se nas mãos dos carrascos e das feras por amor a Cristo Jesus, e a audácia com que increpavam seus algozes, multidões se convertiam. Segundo a famosa frase de Tertuliano, “o sangue dos mártires era a semente de cristãos”.

Assim, aconteceu nas cidades de Lyon e Vienne, onde o enorme crescimento de cristãos, fez aumentar o ódio do cruel imperador Marco Aurélio, determinando que, nestas duas cidades da Gália, aquele que se apresentasse como cristão, por lei, deveria ser morto. Entre o povo se espalhava inúmeras calúnias contra os cristãos, que os tornavam mal vistos nos mercados, nas ruas e nas praças públicas. O furor desta população se manifestou principalmente contra um diácono chamado Santo, natural de Vienne que exercia seu ministério na cidade de Lyon. Conseguiram prendê-lo e levaram-no ao tribunal. Como era estrangeiro interrogaram-no: “Qual é o seu nome?”. Ele respondeu: “Sou cristão”.

Estupefatos com tal resposta, perguntaram: “Qual é sua pátria?”. Santo respondeu: “Sou cristão”. Confusos e com muito ódio perguntaram: “Qual é o seu ofício, e o que faz?”. Sem temor e com toda convicção, replicou mais uma vez: “Sou cristão”. E a todas as perguntas que lhe faziam, respondia jubilosamente somente com essas palavras: “Sou cristão!”.

Esta afirmação ressoou aos ouvidos dos carrascos como sinal de condenação, que indignados e furiosos açoitaram Santo com lâminas de bronze incandescentes, de modo que seu corpo tomou-se uma única chaga, perdendo o aspecto humano. Como ainda lhe restara vida, o imperador mandou estendê-lo sobre o potro (cavalo de madeira em que se torturavam os condenados), mas qual não foi sua surpresa quando, tendo acabado esse suplício, o corpo de Santo recuperou-se miraculosamente voltando à forma normal.

Por fim, levaram o diácono Santo e mais um companheiro, que também aderira ao cristianismo, ao anfiteatro onde foram flagelados, arrastados pelas feras, sentados em cadeiras de ferro em brasas e, permanecendo firmes na fé, foram por fim degolados. Para os imperadores, acabar com a existência de um cristão era uma pseudo vitória, mas “para a Igreja de Cristo era mais um mártir e no céu mais um santo”.1

Este sangue gloriosamente derramado trouxe muitos frutos para a Igreja, pois, o ardente desejo de derramarem todo seu sangue em defesa da Fé, fez com que não só eles recebessem a coroa da glória eterna, mas também muitos outros que, vendo o exemplo destes mártires, se converteram, e os que haviam apostatado covardemente, movidos por um verdadeiro arrependimento, confessaram novamente a fé e foram também martirizados.

Alguém poderia objetar, dizendo que seria melhor que eles vivessem para expandir o Reino de Deus. Porém, a ideia de serem apóstolos de outra maneira nem lhes passava pela cabeça, pois “o exemplo heróico do martírio dos primeiros cristãos atraiu para a Fé muito mais gente do que se eles não tivessem oferecido suas próprias vidas, de modo que morrendo, eles faziam mais apostolado que vivendo”.2 Muitas pessoas perseveraram ao longo dos séculos, entraram para a Igreja e se santificaram em virtude desse exemplo, como São Santo, santo não só pelo nome, mas também pelo modelo de vida.

Quão grandioso é, depois de dois mil anos, sentir-se incorporado ao santos mártires na mesma Fé e como irmãos na grande família cristã. Sejamos, pois, imitadores destes magníficos exemplos, e se no futuro tivermos que sofrer por causa do nome de Cristo, glorifiquemos a Deus que nos deu o exemplo máximo do martírio morrendo na Cruz, confiantes de que, se permanecermos firmes na Fé, receberemos a coroa da glória que nos espera!

1CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. Na avenida dos becos sem saída, a vitória de Cristo Triunfador: Conferência. São Paulo, 3O jun. 1993. (Arquivo IFTE).
2CORRÊA DE OLIVEIRA, Plinio. Organização e sabedoria na Igreja das catacumbas: Conferência. São Paulo, 1O jul. 1982. (Arquivo IFTE).

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