Aflições, crises, catástrofes? Eis a solução.

Ir. Elen Coelho, EP

Corria o século XII. Encontrava-se a Cristandade ameaçada por uma terrível heresia que rapidamente se infiltrou em toda a Europa. Denominados como cátaros, albigenses, ou puros, estes hereges encontraram um terreno bem preparado para semearem sua doutrina, que mais do que herética era terrivelmente anticristã.

Um dos principais focos desta heresia estava na França, especialmente na região do Meio-Dia, do Languedoc, de Toulouse e seus limites até os Pirineus.

Grandes aflições passavam os missionários do Languedoc, especialmente São Domingos. Tomado por uma moção interior, dirigiu-se a uma floresta próxima a Toulouse a fim de fazer penitência e implorar que Deus “tivesse pena de sua própria glória calcada aos pés pela heresia”. 1 Foram três dias e três noites de austeros sacrifícios, gemidos, lágrimas e, sobretudo, de oração. Quando seu corpo estava a ponto de desfalecer, Maria Santíssima, resplandecente, lhe apareceu:

A Santíssima Virgem que estava acompanhada de três princesas do Céu lhe disse: “Sabes tu, meu caro Domingos, de que arma a Santíssima Trindade se serviu para reformar o mundo?” – “Ó Senhora!” respondeu ele, “Vós o sabeis melhor do que eu porque depois de Vosso Filho Jesus Cristo fostes o principal instrumento de nossa salvação”. Ela continuou: “O instrumento principal dessa obra foi o saltério angélico que é o fundamento do Novo Testamento. Portanto, se queres ganhar para Deus esses corações endurecidos, reza meu saltério.” 2

Não se sabe se nesta ocasião Maria Santíssima lhe ensinou a rezar o Rosário, ou se esta devoção já existia, ou ainda se, por uma ação da graça, ele intuiu como recitá-lo. O certo é que o santo pregador compreendeu perfeitamente o que deveria fazer e, após a celeste aparição, com o ânimo reconstituído e inflamado de zelo pela salvação das almas, levantou-se imediatamente e dirigiu-se à Catedral de Toulouse. Sua chegada foi precedida pelo toque grave dos sinos que, miraculosamente, chamavam as pessoas para a Catedral. O santo entrou e, ao se posicionar no púlpito e iniciar a pregação, a própria natureza pôs-se a enfatizar suas palavras:

Assim que iniciou seu sermão, desencadeou-se uma tempestade terrível, a terra estremeceu, o sol se escureceu, houve tantos trovões e raios que todos ficaram muito temerosos. Ainda maior foi o seu medo quando olharam a imagem de Nossa Senhora, exibida em local privilegiado, e a viram levantar os braços em direção ao Céu, três vezes, para acalmar a vingança de Deus sobre eles, caso eles falhassem em se converter, arrumar suas vidas e procurar a proteção da Santa Mãe de Deus. 3

Deus permitiu tais fenômenos e milagres para que aqueles corações endurecidos se impressionassem, e se movessem à conversão.

São Domingos rezou a Deus, e a tempestade se acalmou. Ele continuou sua pregação mostrando a importância do Rosário. Os presentes ficaram tão impressionados com o ocorrido e com as palavras impregnadas de fogo de São Domingos que naquele mesmo dia praticamente toda a cidade se converteu. 4

A partir do momento em que São Domingos deu início à difusão da devoção ao Santo Rosário, Maria Santíssima começou a derramar abundantes graças aos que o recitavam.

Após a morte de São Domingos, seus filhos espirituais continuaram a pregação do Santo Rosário. Entretanto, transcorrido um século, o fervor em relação a esta devoção foi se apagando até quase ao esquecimento.

Dessa forma, o Rosário, precioso canal de graças utilizado por Deus para derramar graças à humanidade, foi bloqueado e um grande castigo infligiu a Europa: a terrível peste negra assolou o continente por três anos, deixando-o quase deserto. Tal catástrofe foi sucedida por dois outros flagelos: a heresia dos flagelantes e o cisma de 1376. 5

Contudo, Nossa Senhora não permitiu que esta situação se prolongasse e, após ter cessado tais calamidades, escolheu um filho de São Domingos para que reavivasse a devoção a seu Rosário.

Beato Alano de la Roche

Alano de la Roche nasceu em 1428, na Bretanha. Ingressou na Ordem dos Pregadores quando ainda muito jovem. De inteligência privilegiada e dotado de grande eloquência, rapidamente se tornou um perfeito orador.

Contudo, dizem as Sagradas Escrituras: “Meu filho, se entrares para o serviço de Deus, permanece firme na justiça e no temor, e prepara a tua alma para a provação” (Ecl 2,1). Durante sete anos o Beato Alano foi acometido por aridezes e infestações do demônio. Numa ocasião, quando mais especialmente atravessava um período de tremenda aridez, Maria Santíssima lhe apareceu no interior de sua cela para consolá-lo, e entregou-lhe uma corrente feita com seus próprios cabelos, na qual estavam entrelaçadas cento e cinquenta pedras preciosas, de acordo com o número de contas do Rosário. A Rainha do Céu lhe explicou nesta ocasião que este instrumento lhe serviria como uma poderosa arma contra o inimigo infernal. 6

Terminada a aparição, Alano compreendeu a necessidade do Rosário para sua vida espiritual. No entanto, a Providência queria dele algo além de um puro aumento de sua piedade.

Um dia em que celebrava a Santa Missa, após a Consagração, a Hóstia que segurava nas mãos assumiu a figura de Nosso Senhor, que severamente o repreendeu, dizendo:

“Alano, tornas a crucificar-Me uma segunda vez?” O Dominicano assustado lhe respondeu: “Ó Senhor Jesus, como posso ser capaz de tamanha crueldade?” Nosso Senhor lhe responde: “Preferia ser novamente crucificado, a ver o Meu Pai ofendido com os pecados por ti cometidos. Tu pecas de omissão! Possuis a ciência, a faculdade e o dever de pregar o Santo Rosário e não o fazes. O mundo está cheio de lobos e tu te transformaste num cão mudo, incapaz de ladrar. Se não te corriges, Eu juro pelo Meu Pai, que será pasto dos míseros mortais”. 7

Após essas palavras o Divino Salvador lhe mostrou o inferno e o lugar para onde iria se não tomasse a séria resolução de pregar o Rosário. Alano, impressionado com a divina reprovação, tornou-se um incansável pregador do Rosário. Por meio de pregações conseguiu reavivar as Confrarias do Rosário e quando chegou o dia de entregar sua alma a Deus já havia congregado mais de cem mil filhos e membros das Confrarias.

Vemos assim que por meio do Rosário, a Divina Providência quis renovar a face da Terra. O Rosário é uma das devoções mais diletas da Santíssima Virgem: “Depois do Santo Sacrifício da Missa, não há nada na Igreja que ame mais do que o Rosário”. 8

E ainda na Mensagem de Fátima encontram-se as maternais palavras de esperança da Mãe de Deus e o meio que Ela põe a nosso alcance para solucionar a crise contemporânea: “Rezai o Rosário todos os dias, para alcançar a paz”

1 CLÁ DIAS, João Scognamiglio. Fátima, Aurora do Terceiro Milênio. 2.ed. São Paulo: Takano, 1998. p.83.
2 Ibid. p. 83-84.
3 SÃO LUÍS MARIA GRIGNION DE MONTFORT. O Segredo do Rosário. Trad. Geraldo Pinto Faria. Belo Horizonte: Divina Misericórdia, 1997.p. 13.
4 Loc. cit.
5 SÃO LUÍS MARIA GRIGNION DE MONTFORT. O Segredo do Rosário. Op. cit. p.19.
6 PAOLA, Roberto (Org.). Il Salterio di Gesù e di Maria:Storia e rivelazioni del Santissimo Rosario. Conegliano: Ancilla, 2006, p. 56.
7 SPIAZZI, Raimundo. Cronaque e fioretti del monastério di San Sisto all’’Appia. Roma: Raccolta di storici,tradizioni e testi d’archivio, 1994, p.359-360.
8 SÃO LUÍS MARIA GRIGNION DE MONTFORT. O Segredo do Rosário. Op. cit. p.150.

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